segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Reportagem do Jornal Barriga - Verde de 1975 - por Adaír Dittrich



"Estas Crianças Ficarão Sem Aula"




 Sob este título o jornal semanário "Barriga Verde" publicou uma reportagem que teve intensa e imensa repercussão.


Com a eterna desculpa de "FALTA DE SUSTENTAÇÃO FINANCEIRA", em Ofício com a data de 20 de março de 1975, o Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina, em uma canetada só, indeferia o Processo da Escola Manoel da Silva Quadros que postulava a oficialização da Sétima Série do 1º. Grau.

Foram dias tumultuados em nossa vila. Minha irmã, Avany Dittrich Jürgensen era a Diretora da Escola e passou por uma rede de espinhos no decorrer de todo este entrevero que ficou marcado em nossas vidas e na vida da população de Marcílio Dias.
A Sétima Série já vinha funcionando, normalmente, desde o início daquele ano letivo e contava com vinte e sete alunos. A comunicação oficial estourou como uma bomba na comunidade de nossa vila. Ingentes esforços foram encetados.
Pais e Professores uniram-se e após diversas reuniões solicitaram à Coordenadoria Local de Educação que enviasse um ofício ao referido Conselho Estadual para que o mesmo, conscienciosamente, revisse a sua atitude e revogasse o indeferimento.
Uma elegante e bem escrita reportagem, escrita por meu irmão, Advogado Dr. Aldo Pedro Dittrich, foi publicada na edição 2261 do dia 06 de abril de 1975 do Jornal "Barriga Verde", com imagens captadas pelas lentes do fotógrafo Egon Thiem que sempre nos acompanhava em nossas lides jornalísticas.
A reportagem transcreve todos os itens do Ofício enviado pela Coordenadoria Local de Educação. O referido ofício enfatizava, entre outros detalhes, que a própria comunidade construíra, com extremo sacrifício mais duas salas de aula, justamente para que os estudantes pudessem frequentar uma escola em sua própria terra.
Também foi dado ênfase ao fato de que os pais dos alunos não poderiam arcar com os custos do transporte, pois era grande a distância a ser percorrida por eles até a mais próxima escola onde pudessem continuar os seus estudos.
Os estudantes da 5ª. e 6ª. series que já estavam em funcionamento apresentavam excelentes resultados e aproveitamento. Também deveria ser considerada a eficiência da Direção e Docência que não mediram esforços para levar a bom termo o ensino nas diferentes áreas.

Importantíssimo será sempre relembrar para as novas gerações que "atualmente é a comunidade (de Marcílio Dias) que mais tem contribuído em prol do ensino público procedendo à doação gratuita de terreno e prédio com oito salas de aula e mais dependências, tendo o Estado construído tão somente duas salas de aula".

Ao finaliza seu ofício a Coordenadora Local de Educação ainda salienta "tendo em vista que o não funcionamento da 7ª. série na Escola Manoel da Silva Quadros, virá prejudicar altamente o ensino, havendo evasão de 27 alunos, estancando a sua formação, não tendo mais qualquer possibilidade de prosseguimento cultural e educacional.

Dizia o "Barriga Verde" no introito da reportagem:

"Esta medida do Conselho Estadual de Educação, lamentavelmente, vem revelar que as pessoas que integram o referido Conselho desconhecem a realidade catarinense e, ao invés de contribuírem para o desenvolvimento do ensino em nosso estado, contribuem para a sua regressão."





"Tal medida causou a mais profunda repulsa de toda a Comunidade de Marcílio Dias, uma vez que, dezenas de alunos que lá estavam matriculados, normalmente, terão que abandonar os estudos".


Sob o subtítulo "OPINIÃO DE UMA PROFESSORA", o Barriga Verde anotara alguns dados para demonstrar a inconsistência da medida tomada pelos conselheiros de educação de nosso estado. A professora, cujo nome não fora citado pelo jornal, afirmava que a Escola Manoel da Silva Quadros contava então com 600 alunos, 24 professores, sendo 10 da 1ª. à 4ª. série e 14 que lecionavam para os alunos da 5ª. à 7ª. série. Refutava ainda a afirmação do Conselho de que "não há sustentação financeira", com a seguinte afirmação:





"Pelos meus cálculos, que estão corretos, o Estado de Santa Catarina, com o funcionamento da 7ª. série, irá dispender a ínfima quantia de Cr$1.300,00 mensais, quantia essa que não atinge o valor de quatro salários mínimos".


A reportagem também ressalta "o povo de Marcílio Dias sempre lutou e conseguiu, com seus próprios recursos, manter um estabelecimento escolar para a sua comunidade."
"Desde 1917 já funcionava uma escola construída e mantida pela comunidade. O povo de Marcílio Dias até hoje reverencia a memória do Professor João Moeller que foi o primeiro mestre da "Escola Particular São Bernardo".
"Em 1942 a comunidade doou a referida Escola ao Estado, porém, o povo de Marcílio Dias continuou a zelar pelo seu patrimônio escolar."
"O Jardim de Infância existente em Marcílio Dias é mantido pela comunidade".
"O Presidente da Associação de Pais e Professores, senhor Frederico José Kohler declarou que estava indignado com a medida e que não encontra justificativa par a mesma."
"Disse ainda que a comunidade toda estava chocada e perplexa ante tal decisão inconcebível em pleno século XX"
Frederico José Kohler, o inesquecível "Ico Kola" solicitou ainda que duplicássemos a tiragem da edição de nosso "Barriga Verde" que publicaria a reportagem sobre a escola e que exemplares do jornal fossem enviados a todas as revistas e jornais de grande circulação no país.

"E que, inclusive, chegue a notícia ao Palácio do Planalto onde possa ser lida pelo Exmo. Sr. Presidente da República General Ernesto Geisel".
A repercussão da reportagem foi intensa. As discussões em torno dela não tinham fim, quer nas rodinhas dos bares e botecos, como entre os ilustres componentes de clubes de serviços e de associações de classe.
O grande jornal diário da capital paulista "O Estado de São Paulo", transcreveu, na íntegra, a reportagem publicada no nosso semanário "Barriga Verde".
O assunto não poderia permanecer em branco entre as autoridades constituídas. Imperioso é lembrarmo-nos de que vivíamos num regime de exceção e de perseguições a quem ousasse espinafrar o poder constituído.
A repressão não se fez esperar. Minha irmã, Avany Dittrich Jürgensen, foi devida e sumariamente processada, necessitando apresentar-se, para esclarecimentos, junto à Coordenadoria Regional de Educação que era sediada na, nem tão perto naquela época, cidade de Mafra.
Esta história continua.



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